29 de maio de 2010

POESIA

A propósito do último post que publicámos com o título FUI À HORTA DELA! decidimos prestar uma singela homenagem ao poeta setubalense António Maria Eusébio, o “Calafate” que publicou algumas poesias sobre o mesmo tema, como as que se seguem: “A quinta da Panasqueira” e “A resposta da quinteira”

(Wikipédia) - António Maria Eusébio, o “Calafate” ou o “Cantador de Setúbal”, (Setúbal, 15 de Dezembro de 1819 — Setúbal, 22 de Novembro de 1911) foi um poeta popular português.

Biografia: Conhecido por o “o Calafate devido à profissão de artífice da construção de barcos de madeira e por o “Cantador de Setúbal” pelo tema, quase constante dos seus poemas: a cidade de Setúbal que tanto amou.

Para além da cidade, António Maria Eusébio versejou sobre as gentes, os hábitos, o ridículo do seu tempo, em que não faltam os retratos pessoais, sociais e políticos, as cenas de erotismo jocoso, a descrição das situações e as máximas proverbiais da vida.

Já octogenário, o poeta Calafate publica pela primeira vez os seus versos em folhetos (meio muito usado pelos poetas populares para dar a conhecer os seus versos), ganhando com isso alguns tostões para sua subsistência. Deve-se à iniciativa do general Henrique das Neves e a dádivas de muitos amigos do poeta a publicação dos folhetos na então Tipografia Mascarenhas.

Na primeira edição dos folhetos dava-se a seguinte explicação: “Ao amigo do autor afigurou-se-lhe que, publicando em edição especial estas Recordações, não somente contribuiria para afirmar mais uma vez o engenho do Cantador de Setúbal, auxiliando-o conjuntamente com a receita que daqui lhe possa advir, mas também se lhe afigurou que enriqueceria a nossa literatura popular com uma obra de singular valor no seu género literário.”

Em 1901, e por iniciativa também de Henrique das Neves, são impressos 600 exemplares de “Versos do Cantador de Setúbal”, com prefácio de Guerra Junqueiro.

A quinta da Panasqueira

Mote

Fui apalpar as gamboas
que a quinteira tem na quinta
já tem marmelos maduros
o seu bastardo já pinta.

Glosa

Sou mestre na agricultura
meu saber ninguém disputa
gosto de apalpar a fruta
quando está quase madura...
Gosto do que tem doçura
quero e gosto das mais pessoas
para apalpar coisas boas
da quinta da Panasqueira
com licença da quinteira
fui apalpar as gamboas.

Por toda a parte que andei
dei cambalhotas e saltos
depois de apalpar pêlos altos
pêlos baixos apalpei.
Por toda a parte encontrei
fruta branca e fruta tinta
para que a dona não se sinta
nunca direi mal da boda
apalpei a fruta toda
que a quinteira tem na quinta.

Neste tão lindo arvoredo
não há fruta como a sua
foi criada em boa lua
para amadurecer mais cedo.
Menina, não tenha medo
que os seus frutos estão seguros
ou sejam moles ou duros
todos a têm em estima
na sua quinta de cima
já tem marmelos maduros.

Tem uma árvore escondida
num regato ao pé dum poço
que dá fruta sem caroço
chamada gostos da vida.
Dessa fruta pretendida
que a menina tem na quinta
a menina dê-me um cacho
que na sua quinta de baixo
o seu bastardo já pinta.

A resposta da quinteira

Mote

Fui apalpar os tomates
que tinha o meu hortelão,
mostrou-me o nabal que tinha,
meteu-me o nabo na mão.

Glosa

Sou mestra na agricultura
tenho terra para cavar
gosto sempre de apalpar
se a enxada é mole ou dura.
Ser amiga da verdura
não são nenhuns disparates
enchi alguns açafates
de tomateiros de cama
depois de apalpar a rama
fui apalpar os tomates.

As sementes tomateiras
nascem por dentro e por fora
semeiam-se a toda a hora
dentro de fundas regueiras.
Tão brilhantes sementeiras
dão gosto e satisfação.
Dentro do meu regueirão
dão-me as ramas pelos joelhos
que tomates tão vermelhos
que tinha o meu hortelão!

Só de vê-los e apalpá-los
faz andar a gente louca
faz crescer água na boca
e a língua dar estalos.
Meu hortelão tem regalos
tem hortaliça fresquinha
no vale da carapinha
tem um tomateiro macho
abriu-me a porta de baixo
mostrou-me o nabal que tinha.

Tinha grelos e nabiças
tinha tomates graúdos
tinha nabos ramalhudos
com as cabeças roliças.
Tão brilhantes hortaliças
meteram-me a tentação
era franco o hortelão
deu-me uma couve amarela
para me dar gosto à panela
meteu-me o nabo na mão.


2 comentários:

jorge fagundes disse...

A título de curiosidade, um bisneto do poeta "Calafate" vive no Barreiro há muitos anos. É o António Alberto Claro, que trabalhou na CUF.

Álvaro Morgado disse...

Amigo Fagundes
Achei interessante a sua informação. Aliás já conheço (a obra, claro) este poeta desde o livro da Poesia Erótica e Satírica de Natália Correia, livro que possuo, embora neste momento não saiba onde.
Obrigado pela informação.